Recentemente, o tenista Andrey Rublev fez uma declaração impactante durante um torneio, revelando sua luta contra a depressão há muitos anos. Observadores atentos do esporte provavelmente notaram seu comportamento mais irritadiço e explosivo em quadra. A noção de que atletas bem-sucedidos não teriam motivos para sofrer de depressão é amplamente difundida, o que dificulta o aprofundamento nesse tema. Abordar uma condição de saúde mental torna-se ainda mais desafiador quando o próprio indivíduo questiona como pode estar passando por isso, considerando sua realidade aparentemente privilegiada, ou quando acredita que os outros farão o mesmo questionamento, sem empatia ou interesse em compreendê-lo.
A depressão, em geral, é uma condição complexa e de difícil tratamento, com tendência à cronificação, especialmente quando há demora na busca por ajuda. Contudo, pesquisas recentes começam a indicar que essa condição apresenta particularidades em atletas. Um estudo de 2016, publicado na revista Frontiers in Psychology por Steven Doherty, Barbara Hannigan e Mark J. Campbell, identificou aspectos relevantes sobre o transtorno em atletas profissionais em três dimensões distintas: (1) fatores que influenciam o surgimento da depressão; (2) formas de manifestação dos sintomas; e (3) estratégias de enfrentamento para a recuperação.
Fatores que influenciam o surgimento da depressão em atletas
Na pesquisa com oito atletas entrevistados, foram identificados os seguintes padrões associados à depressão: (1) uma identificação excessiva com a identidade de atleta, tornando-os dependentes dos resultados para validar seu valor e sustentar sua autoimagem. Em outras palavras, é como se a percepção de si mesmo dependesse do desempenho esportivo, levando a um questionamento da própria identidade quando os resultados não são satisfatórios; e (2) uma cultura esportiva que exalta os ideais de força e persistência, inibindo demonstrações de vulnerabilidade e a busca por auxílio, vistas como sinais de fraqueza, o que dificulta o reconhecimento do transtorno.
Como os sintomas se manifestam em atletas
A manifestação da depressão em atletas geralmente é tardia. Primeiramente, porque, assim como a maioria das pessoas, os esportistas desconhecem muitos dos sintomas clássicos da depressão, o que leva à negligência dos primeiros sinais. Em segundo lugar, os atletas associam os sintomas à fragilidade e falta de vigor. Eles assumem total responsabilidade, acreditando que cabe somente a eles resolver o problema. Além desse desconhecimento, os indícios de depressão nesse contexto esportivo também ficam mascarados pelos efeitos benéficos da prática esportiva, que normalmente estimula a produção de endorfina, dopamina e serotonina, proporcionando uma sensação de bem-estar.
Devido a esses fatores, frequentemente é mais fácil identificar a depressão em atletas quando estão fora do ambiente esportivo. Ao observar sua vida pessoal, geralmente notamos rompimento ou distanciamento de relações. A autocrítica saudável e necessária para melhorar o desempenho se intensifica e passa a ser uma perspectiva pessimista que extrapola sua prática esportiva, contaminando sua percepção da realidade como um todo. Apenas quando a depressão atinge um nível significativo na vida do indivíduo, ela se torna perceptível na prática esportiva, manifestando-se através de explosões de raiva, choro ou completa desmotivação para continuar a carreira.
Estratégias de enfrentamento da depressão em atletas
Quando os primeiros sintomas surgem, as reações iniciais tendem a ser semelhantes às observadas em pessoas não atletas: isolamento social, afastando-se de amigos e familiares, e uso de substâncias como álcool ou outras drogas para alívio temporário dos sintomas. Ambas as estratégias são consideradas mal-adaptativas, pois não proporcionam uma melhora duradoura; ao contrário, tendem a evitar que o desconforto aumente e adiam a busca por ajuda adequada. No entanto, o estudo aponta um aspecto positivo no tratamento da depressão nessa população. Atletas profissionais, tanto por características de personalidade quanto por aprendizado, costumam ter grande foco e determinação, qualidades essenciais para se destacar nos esportes. Essas habilidades, quando direcionadas ao tratamento e com o suporte de um profissional qualificado, tendem a contribuir significativamente para a melhora do quadro e a redução dos sintomas.
O tratamento da depressão é complexo e requer acompanhamento psiquiátrico e psicoterapêutico simultâneos. Para atletas, o processo envolve a expansão de suas identidades para além da profissão, a reavaliação de ideais e expectativas, e o desenvolvimento da capacidade de utilizar sua rede de apoio de forma saudável. Embora não seja uma jornada fácil, não é aconselhável tentar atravessar essa tempestade sozinho e sem auxílio profissional. A carreira de um atleta profissional tende a ser breve, e optar por abordagens não convencionais de tratamento pode consumir um tempo precioso dessas pessoas.
Para atletas, treinadores e familiares que chegaram até este ponto, meu conselho permanece constante: em caso de dúvida, procure um profissional de saúde qualificado. Não vale a pena correr riscos nessas situações. Reflita sobre como reagimos diante da suspeita de uma doença física grave. Ninguém espera muito para verificar se aquela dor ou sintoma pode ser algo mais sério. O tempo e a complexidade do tratamento da depressão, assim como de outros transtornos mentais, são diretamente proporcionais ao tempo que se leva para diagnosticar e iniciar o tratamento. Quanto mais cedo se buscar ajuda, mais fácil e rápido tende a ser o processo de recuperação.
Referências
Doherty, S., Hannigan, B., & Campbell, M. (2016). The Experience of Depression during the Careers of Elite Male Athletes. Frontiers in Psychology, 7. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2016.01069.
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